domingo, 7 de novembro de 2010

Como me tornei um Cão Terapeuta

Lembro até hoje o olhar que a Silvana me lançou quando viu um documentário na TV a cabo sobre terapias com animais em um hospital dos EUA com crianças, vários voluntários e seus cães. Ela ficou maravilhada. Estava já algum tempo procurando um trabalho voluntário para ajudar de perto pessoas necessitadas. Chegou a procurar associações específicas para voluntariado, mas nada tinha despertado algo dentro dela.
Vocês se lembram que ela começou a me chamar de Dr.Paraná? Pois é!!! Conhecia aquele olhar e pensei: lá vou eu.
Após procurar pela internet, finalmente ela achou o que queria: Projeto Cão do Idoso.
Fez sua entrevista de triagem. Passou. Agora era a minha vez. Foi marcada a minha avaliação.
Foi uma semana de preparativos. Ela me levou ao veterinário onde tomei mais duas vacinas. Não preciso nem falar que além de doer muito, fiquei, direi, “sem sentar” por uns dias. Até aí eu não estava entendendo nada. Achei que estava doente.
Como minha avaliação fora marcada para domingo, na sexta-feira, ela me levou para a banheira dela. Acreditem, tomei um banho de espumas. Nunca tinha usado tantos xampus e cremes. Saí de lá tão cheiroso que os outros cães até me estranharam. Sem falar no secador de cabelo que me deixou surdo por horas. Ainda teve o lance do cotonete. Começou a passar em todos os buracos do meu corpo. Na dúvida, sentei...
O resultado final ficou, sem modéstia, lindooo. Me senti um verdadeiro “Star”.
Durante o banho compreendi qual era o objetivo da minha mãe. Ela conversou comigo. Explicou que queria muito ajudar pessoas que não podiam mais se ajudar sozinhas. Que também não queria fazer este trabalho sozinha e que tinha me escolhido para seu parceiro por acreditar que eu era um doutor em forma de cachorrinho. Ela ainda me falou que desde o momento em que cheguei à vida dela, percebeu o quanto eu era especial, como gostava das pessoas, de outros animais, da minha sensibilidade com a Vick, enfim, encheu bastante a minha bola.
Poxa, quanta responsabilidade!  Comecei a ficar nervoso... Minha cabeça rodava de ansiedade, sem falar do meu estômago. E se eu não passasse? E se não gostarem de mim? Era um montão de “ses”... Mas aquele olhar dela para mim fazia eu esquecer de tudo.
Finalmente chegou o dia. Ambos estávamos muito nervosos. A Silvana acordou mais cedo do que o habitual para se preparar e me preparar. Me escovou tanto que pensei que fosse ficar careca, mas não reclamei. Sabia que era nervosismo. Meu pêlo brilhava...
Fui colocado no banco de trás do carro. No meio do caminho não quis falar nada, mas tava enjoando... Não deu outra. Pus para fora o meu café da manhã. Fiquei paralisado. E agora? Tentei disfarçar... Impossível com os vidros fechados do carro... Quando ela parou o carro de repente, senti que o bicho ia pegar.
Silvana ficou branca, depois vermelha. Nossa que esquisito, como ela conseguia aquilo?
O pior, não falou nada. Simplesmente colocou a cabeça na direção do carro e ficou lá. Eu ainda estático com medo de me mexer. Na verdade nem dava.
Após alguns minutos que me pareceram uma eternidade, seguimos para um posto de gasolina. Lá ela me limpou e limpou o carro. Com muita calma, acredito que era mais para ela do que para mim, me disse que estava tudo bem e que também acontecia com ela quando era pequena.
Respirei fundo, mas não tão fundo porque o cheiro no carro estava um horror. Pensei comigo: vai dar certo.
Lá no asilo, após nova sessão de escovação (realmente naquele momento achei que fosse ficar sem a pele) aguardamos a nossa vez.
Fui colocado na frente da Kátia, ela era a adestradora do Projeto. Fui logo com a cara dela. Hoje ela é uma das minhas melhores amigas e é a maioral em comportamento animal da nossa ONG.
Minha mãe ficou o tempo todo ao nosso lado.
De repente Kátia começou a fazer uns barulhos estranhos. Meu Deus! O que era aquilo? Será que estava possuída?! Gritou, espirrou, tossiu, bateu palmas, os pés. Passou as mãos pelo meu corpo inteiro, puxou o meu rabo (aliás, meu mini rabo), minhas orelhas... Eu queria sair correndo... A cada gesto dela, eu olhava para minha mãe. Novamente encontrava aquele seu olhar que somente ela me dava. E eu pensava: eu vou conseguir, eu vou conseguir.
Finalmente acabou, ufa...Eu tinha conseguido! Passei!
Não preciso nem falar que a Silvana me encheu de beijos, toda orgulhosa me dizendo o quanto me amava e que sabia que eu era capaz. Ainda me disse que eu tinha feito dela uma pessoa muito melhor. Para um cão de rua como eu aquilo era como ganhar na loteria.
Foi incrível.
A partir daquele dia, nunca mais a minha vida e a dela foram a mesma. Tornamos-nos mais comprometidos, mais responsáveis, mais afetivos, mais unidos e muitos mais.
Depois destes anos todos como Cão Terapeuta, olho pra trás e tenho a certeza que valeu a pena. Faria tudo outra vez, pelos assistidos e principalmente por ela, minha mãe.

5 comentários:

  1. Não tem o que dizer. O Paraná é tudo de bom!!!
    Beijos e Auaubraços

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  2. Nao e a toa que o Benji te adora. Voce e fofissimo!!!!!!!!!!!!! ( desculpe meu comp nao tem acentos)Joyce

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  3. oi paraná! eu sou julieta e já lhe conheço!sua mamãe é um amor de criatura e eu tambem tenho uma mãe que é um barato.também estou na luta como voce,só que, sou cão de alarme, na defesa dos velhinhos. vamos estreitar nosso relacionamento! focinhadas umidas julieta

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  4. Era mais uma manhã de domingo. Acordei, tomei meu café e fui para o asilo. Enquanto dirigia, fiquei imaginando coisas corriqueiras que aconteciam em dia de avaliação, como por exemplo, quando aparece um cão que segundo a dona é um santo, mas quando levo uma mordida ela lembra de me alertar: “ele só não gosta que passem à mão na cabeça dele”.
    Cheguei ao asilo e já havia um grupinho de cães e seus donos. Dei uma olhada geral para ver o que me esperava e vi um vira-latinha com uma barbinha sentado com a cara meio assustada. Pensei: que cachorro mais fofinho, espero que seja castrado. Olhei para sua dona e pensei de novo: “Ih, mais uma dondoca que pegou um srd porque agora ta na moda”.
    Chegou à hora da avaliação. O cãozinho super fofo, castrado, com um olhar de cachorro abandonado que eu não resisti. Tinha cheirinho de lavanda de bebê. Senti um cheiro de vomito na sua boca e pensei pela terceira vez, “acho que a dona deve ter pressionado tanto o pobre coitado que ele até vomitou”.
    Acabei de fazer a avaliação e dei o veredito: PASSOU. No fundo eu pensei pela última vez. “Pena que essa madame não vai agüentar acordar cedo no domingo, ponho minha mão no fogo como ela vai desistir depois de um mês”.
    Bem, como vc pode perceber, eu até que entendo de cachorro, mas no que diz respeito
    a ser humano...
    P.S. Depois dessa, não ponho mais minha mão no fogo nem por DEUS!

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