quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

Lembranças de um Natal

O Natal está chegando.
Já estamos em dezembro.
Logo, logo entrarei de férias dos meus trabalhos deste ano como Cão Terapeuta.
Revendo fotos antigas do meu trabalho no asilo Vivência Feliz me deu uma saudade muito grande da minha querida amiga.
Dona Maria, simplesmente Maria. Ela não tinha sobrenome, documento e nem sabia a sua data de nascimento, mas foi uma das melhores pessoas que conheci.
Ela não tinha uma das pernas a partir do joelho. Era cadeirante.  Mas era tão ativa, empolgada, engajada que ninguém reparava na sua deficiência. Participava de tudo e conhecia todos.
Era uma líder nata. Todos a respeitavam e a consultavam, até os dirigentes do asilo.
Foi ela que me ensinou a beijar.
Um belo dia me olhou e disse que ia me ensinar a dar “selinhos”.
No inicio achei que era brincadeira. Até olhei para os lados para ver se era comigo mesmo. Ela me colocou em cima da cadeira, armou o maior beijo, daqueles bem estalados, segurou a minha cabeça e veio com tudo.
Na hora fiquei até tonto, quase cai da cadeira. Fiquei vermelho, olhei para a Silvana.
Pôxa, meu primeiro beijo e logo do lado da minha mãe!
A partir deste dia, quando chegava ao Vivência já ia procurando por ela a espera do meu beijo.
Nós batíamos muitos papos. Somente eu e ela. Falávamos do nosso dia a dia, do passado e até do futuro.
Tínhamos muito em comum: nós dois fomos resgatados.
Sua alegria de viver era contagiante. Até eu, que às vezes chegava meio cansado, ficava bem por estar perto dela. Ela tinha uma luz especial, brilhava de longe. Impossível não vê-la.
Era uma concorrência... Todos queriam ficar perto dela. Mas ela sempre abria o caminho para me receber e principalmente para me beijar. Convivi com ela por cinco anos. Tornamos-nos grandes amigos.
Um domingo ao chegarmos para trabalhar soubemos que ela tinha partido para junto de Deus.
Tão de repente...  Que tristeza.
Foi como se tivessem aberto um buraco no meu coração. Eu e a Silvana nos abraçamos e choramos.
Olhei para o espaço que ela costumava ficar. Ele estava vazio, como se todos na casa quisessem perpetuar a sua presença.
Pensei: Cadê meus beijos agora?
De repente senti o seu perfume, meus pêlos das costas se eriçaram e percebi que ela nunca iria nos deixar.
O buraco no meu coração foi se fechando com as lembranças dos seus beijos.


terça-feira, 16 de novembro de 2010

Meu Primeiro Dia de Trabalho


Como o primeiro dia de tudo que fazemos, a nossa adrenalina vai a 1000.
Acordei super animado, excitado, ansioso, tenso e ao mesmo tempo muito esperançoso.
Aquele domingo seria o nosso “Debut” (meu e o da Silvana).
Como o de praxe, levantamos mais cedo do que o habitual. Após o nosso café da manhã, seguiu a sessão de higiene: escovação dos meus dentes e igualmente dos meus pêlos. Suportei tudo com muita calma, afinal, sabia que era por uma boa causa. Também tomei um banho de lavanda Johnson’s. Cheirava a bebê. Ainda hoje utilizo, virou meu cheiro.
Seguimos para o asilo Vivência Feliz. Foi escolhido pela Silvana por ser o mais carente e eu aprovei.
No caminho, eu juro, não planejei, mas novamente enjoei... Não acreditei que tinha acontecido tudo novamente e nem a Silvana.
Mas, desta vez, ela estava preparada. Foi munida com toalhas e lenços de papel para o que desce e viesse. Nada como uma boa estratégia.
Nós não conhecíamos a casa. Logo na entrada fomos recebidos pela monitora do Projeto, que foi super calorosa e nos deixou muito a vontade. Passou o que poderíamos fazer e não fazer.
Cada regra, eu olhava pra Silvana e ela pra mim e fazíamos: haha. E foi assim para todas as explicações: haha... haha... Mas no afinal somente se fixaram algumas, pois são tantas coisas para gravar que nem dá tempo pra processar, além dos meus estados de nervos e ansiedade.
Recebi uma bandana super linda, vermelha, com o Logo do Projeto. Senti-me super poderoso. Nunca tinha tido um uniforme de trabalho.
Era a hora de entrar. Novamente eu olhei pra Silvana e ela pra mim. Como algo sincronizado, respiramos fundo, entramos com os nossos “pés” direito.
Uhauuuu... Que coisa mágica. Estava adentrando num mundo totalmente diferente de tudo que tinha experienciado até então.
Quantos cheiros, quantas sensações, quantas pessoas, quantas histórias...
Ambos estávamos muitos nervosos. O que fazer? O que dizer?
Nos orientaram que nesta primeira visita seria para reconhecermos o local, ou seja, o território.
Cada pessoa que conhecíamos tinha um cheiro diferente, um olhar diferente, um carinho diferente, uma história diferente, mas todos tinham em comum o afeto.
Que gente maravilhosa, a maioria queria me tocar. Fui pego no colo, colocado na cadeira, no sofá, até na cama. Passaram a mão no meu corpo inteiro, nos pêlos, orelhas, focinho. E eu, adorando tudo e todos. Nunca tinha sentido tanta energia em tão pouco tempo.
Eu tentei retribuir todas as gentilezas. A Silvana tentava guardar todos os nomes e histórias, assim como eu. Muito difícil para um primeiro dia.
Após meia hora, estávamos exaustos. A monitora pediu para irmos embora. Senti alívio, mas ao mesmo tempo muita tristeza por deixar aquele pessoal tão amado.
Logo percebi que voltaríamos naquele local quinzenalmente. Que legal!
Voltando para casa, eu e minha mãe nos olhamos com cumplicidade. Estávamos certos, finalmente tínhamos encontrado um novo significado para as nossas vidas.
Ela me encheu de beijos e agradeceu novamente por torná-la uma pessoa melhor.
Quer um dia mais feliz e perfeito?  

domingo, 7 de novembro de 2010

Como me tornei um Cão Terapeuta

Lembro até hoje o olhar que a Silvana me lançou quando viu um documentário na TV a cabo sobre terapias com animais em um hospital dos EUA com crianças, vários voluntários e seus cães. Ela ficou maravilhada. Estava já algum tempo procurando um trabalho voluntário para ajudar de perto pessoas necessitadas. Chegou a procurar associações específicas para voluntariado, mas nada tinha despertado algo dentro dela.
Vocês se lembram que ela começou a me chamar de Dr.Paraná? Pois é!!! Conhecia aquele olhar e pensei: lá vou eu.
Após procurar pela internet, finalmente ela achou o que queria: Projeto Cão do Idoso.
Fez sua entrevista de triagem. Passou. Agora era a minha vez. Foi marcada a minha avaliação.
Foi uma semana de preparativos. Ela me levou ao veterinário onde tomei mais duas vacinas. Não preciso nem falar que além de doer muito, fiquei, direi, “sem sentar” por uns dias. Até aí eu não estava entendendo nada. Achei que estava doente.
Como minha avaliação fora marcada para domingo, na sexta-feira, ela me levou para a banheira dela. Acreditem, tomei um banho de espumas. Nunca tinha usado tantos xampus e cremes. Saí de lá tão cheiroso que os outros cães até me estranharam. Sem falar no secador de cabelo que me deixou surdo por horas. Ainda teve o lance do cotonete. Começou a passar em todos os buracos do meu corpo. Na dúvida, sentei...
O resultado final ficou, sem modéstia, lindooo. Me senti um verdadeiro “Star”.
Durante o banho compreendi qual era o objetivo da minha mãe. Ela conversou comigo. Explicou que queria muito ajudar pessoas que não podiam mais se ajudar sozinhas. Que também não queria fazer este trabalho sozinha e que tinha me escolhido para seu parceiro por acreditar que eu era um doutor em forma de cachorrinho. Ela ainda me falou que desde o momento em que cheguei à vida dela, percebeu o quanto eu era especial, como gostava das pessoas, de outros animais, da minha sensibilidade com a Vick, enfim, encheu bastante a minha bola.
Poxa, quanta responsabilidade!  Comecei a ficar nervoso... Minha cabeça rodava de ansiedade, sem falar do meu estômago. E se eu não passasse? E se não gostarem de mim? Era um montão de “ses”... Mas aquele olhar dela para mim fazia eu esquecer de tudo.
Finalmente chegou o dia. Ambos estávamos muito nervosos. A Silvana acordou mais cedo do que o habitual para se preparar e me preparar. Me escovou tanto que pensei que fosse ficar careca, mas não reclamei. Sabia que era nervosismo. Meu pêlo brilhava...
Fui colocado no banco de trás do carro. No meio do caminho não quis falar nada, mas tava enjoando... Não deu outra. Pus para fora o meu café da manhã. Fiquei paralisado. E agora? Tentei disfarçar... Impossível com os vidros fechados do carro... Quando ela parou o carro de repente, senti que o bicho ia pegar.
Silvana ficou branca, depois vermelha. Nossa que esquisito, como ela conseguia aquilo?
O pior, não falou nada. Simplesmente colocou a cabeça na direção do carro e ficou lá. Eu ainda estático com medo de me mexer. Na verdade nem dava.
Após alguns minutos que me pareceram uma eternidade, seguimos para um posto de gasolina. Lá ela me limpou e limpou o carro. Com muita calma, acredito que era mais para ela do que para mim, me disse que estava tudo bem e que também acontecia com ela quando era pequena.
Respirei fundo, mas não tão fundo porque o cheiro no carro estava um horror. Pensei comigo: vai dar certo.
Lá no asilo, após nova sessão de escovação (realmente naquele momento achei que fosse ficar sem a pele) aguardamos a nossa vez.
Fui colocado na frente da Kátia, ela era a adestradora do Projeto. Fui logo com a cara dela. Hoje ela é uma das minhas melhores amigas e é a maioral em comportamento animal da nossa ONG.
Minha mãe ficou o tempo todo ao nosso lado.
De repente Kátia começou a fazer uns barulhos estranhos. Meu Deus! O que era aquilo? Será que estava possuída?! Gritou, espirrou, tossiu, bateu palmas, os pés. Passou as mãos pelo meu corpo inteiro, puxou o meu rabo (aliás, meu mini rabo), minhas orelhas... Eu queria sair correndo... A cada gesto dela, eu olhava para minha mãe. Novamente encontrava aquele seu olhar que somente ela me dava. E eu pensava: eu vou conseguir, eu vou conseguir.
Finalmente acabou, ufa...Eu tinha conseguido! Passei!
Não preciso nem falar que a Silvana me encheu de beijos, toda orgulhosa me dizendo o quanto me amava e que sabia que eu era capaz. Ainda me disse que eu tinha feito dela uma pessoa muito melhor. Para um cão de rua como eu aquilo era como ganhar na loteria.
Foi incrível.
A partir daquele dia, nunca mais a minha vida e a dela foram a mesma. Tornamos-nos mais comprometidos, mais responsáveis, mais afetivos, mais unidos e muitos mais.
Depois destes anos todos como Cão Terapeuta, olho pra trás e tenho a certeza que valeu a pena. Faria tudo outra vez, pelos assistidos e principalmente por ela, minha mãe.

segunda-feira, 1 de novembro de 2010

Vick


Vick foi meu único e grande amor.
Tudo nela desde o início me encantou. Meiga, resignada, amorosa, linda.
Após a nossa castração, toda loucura que sentia por ela se transformou numa grande amizade incondicional.
Nós temos muito pouco tempo de diferença de idade. Ela é um pouquinho mais velha do que eu e como toda fêmea, não gosta de falar sobre este assunto.
Ela já sofreu demais. Resgatada aos seis meses de idade pela Silvana, atropelada na Avenida Indianópolis, deixada no meio fio com a tíbia dilacerada...
Minha mãe voltando para casa viu uma movimentação em torno de algo se mexendo no chão com várias pessoas ao redor. Quando se aproximou, faltando uns 5 metros, conta que a Vick levantou a cabeça, olhando diretamente para ela. Naquele momento, aconteceu uma conexão instantânea.
Foi medicada, engessada, tratada e cuidada. Além de tudo, ainda tinha sarna por todo o corpo.
Mesmo assim, tudo caminhava bem. Por isso, recebeu o nome de “Vitória”, ou simplesmente “Vick” para os mais íntimos.
Por volta de 1 mês, já sem o gesso e super feliz, algo estranho ocorreu. Vick teve uma super febre, de 40 graus. O diagnóstico foi o pior possível: Cinomose já na terceira fase, a neurológica.
É uma doença terrível para nós, cães. Muitas vezes, é fatal.
Causada por um vírus que sobrevive por muito tempo em ambiente seco e frio, em local quente e úmido,  luz solar e desinfetantes comuns. Não escolhe sexo ou raça, nem a época do ano. Ocorre na maioria das vezes nos mais novos, mas também afeta os idosos. Pode ser por contato direto ou pelas vias respiratórias. Sua evolução é imprevisível, ou seja, quando o cão adoece, não há como saber se ele vai sobreviver ou se sua morte vai ser rápida ou lenta. Por isso a vacinação é muito importante. Infelizmente aconteceu com ela. Já os demais cães da nossa casa, bem vacinados, não contraíram nada.
Vick foi tratada por um excelente neurologista veterinário, tomou os mais modernos e caros remédios da época. Sua expectativa de vida chegou aos 10%. Tinha sido afetado o cerebelo, impossibilitando-a de se mexer da cintura para baixo.
O próprio veterinário se compadecendo da Silvana e Luiz que choravam copiosamente recomendou acupuntura como ultimo recurso.
Neste meio tempo, eu cheguei. Logo que a vi percebi que era um ser muito especial. Balançou meu coração. Decidi que faria tudo que estive ao meu alcance por ela.
Enquanto realizava as sessões de acupuntura com uma especialista, eu iniciei a minha sessão particular. Comecei a instigá-la a brincar novamente. Rolávamos no chão, brincava de “eu vou te pegar” e principalmente, mordiscava as suas patinhas traseiras com a minha técnica especial de acupuntura dental. Ela adorava e começou a participar de tudo, super alegre e feliz. Levávamos também a Vick para passear apoiada nas patinhas traseiras várias vezes ao dia.  Eu sempre ao lado dela incentivando-a: “Vamos lá garota, vamos lá, você consegue...”
Minha mãe observava tudo. Passou a me chamar de Doutor Paraná. Quanto orgulho! Logo eu, também  resgatado da rua!
Após seis meses de tratamento e de muita batalha, Vick fez jus ao nome e, num belo dia, andou sozinha. Foi mágico. A casa parou para ver.
A partir de então, Vick aos poucos resgatou a confiança em si mesma. Sobrou somente como seqüela, uma das patinhas dianteiras e um dos olhinhos ficam tremendo, mas somente quando ela fica nervosa. Eu, quase nem percebo mais e até acho um charme.
Hoje ela é muito feliz, nunca mais ficou doente. Seu pêlo é lindo, seus olhos são vibrantes, seu caráter é incrível, sua liderança é alpha, é meiga, elegante e carinhosa. Tornamos-nos inseparáveis.
Compreendi que o primeiro amor a gente nunca esquece.

domingo, 24 de outubro de 2010

Meu amigo Dindi

Meu amigo Dindi se foi.
Na vida, sempre temos um melhor amigo e na minha foi ele.
Eu o conheci desde o inicio do meu trabalho como cão terapeuta. Ele já trabalhava.
Era o meu contra ponto. Lindo, grande, majestoso, impetuoso e com excelente pedigree.
Mas tínhamos algo em comum e que nos uniu: o amor às pessoas.
Era bravo com outros cães que não fossem castrados. Coisas de macho dominante. Com a gente, desde o início, foi diferente e teve sempre muito respeito.
Por isso, minha consideração por ele era tão elevada. Dindi passou a ser o meu ídolo, guru. Queria ser como ele.
Com o tempo, sempre juntos, trabalhando nos asilos, escola ou mesmo passeando na rua (perdi a conta das vezes), percebi que assim como eu, ele era único. Este fato fez com que crescesse ainda mais a minha admiração por ele.
Sei também que muitas vezes Dindi quis ser como eu. Era uma carga muito grande ser tudo que ele era. E como era um cara resignado, compreendeu desde o inicio qual seria o seu papel nesta vida.
Ele exalava afeição. Todos sabiam da sua presença. Fico imaginando, somente para exemplificar, um filme em branco e preto onde o Dindi ao passar vai ficando tudo colorido. Era simplesmente assim.
Formávamos uma boa dupla. Cada um sabia a “deixa” do outro. Bastava um olhar para saber o que o outro queria. E assim foram se passando os anos. Sabia que ele sempre estaria por perto.
Quando soube que o Din (eu o chamo assim), tinha partido, questionei Deus. Não entendi do por que de ter sido tão rápido. Ele lutou bravamente por três meses. Era tão bom, adorava fazer as pessoas se sentirem bem, amadas. Creio que ele veio apenas para fechar com  chave de ouro sua missão. Por isso, foi tão rápido.
Após reflexão, permeado pelas lágrimas, compreendi que todos nós temos a nossa hora. Dindi viveu intensamente tudo. Sei que minha hora chegará também.
Acredito agora que Din me deixou uma super missão, Namour, seu filho, que vive com a nossa família desde os quatro meses, é meu parceiro e segue os passos do pai.
Agora é a minha vez, serei seu guru. Será a minha vez de ocupar um lugar especial. Coisas de amigo.
Eu o amo, sempre o amarei.  Afinal foi o meu melhor amigo.




quinta-feira, 21 de outubro de 2010

Fui castrado...

Tudo começou quando a Vick se recuperou da paralisia.
Passávamos horas brincando de pega-pega, esconde-esconde até cairmos no sono de tanto cansaço.
Mas um belo dia a Vick ficou estranha.
Os demais cães da casa começaram a se comportar de maneira estranha. Queriam ficar perto dela, cheirá-la. Eu também comecei a sentir uma sensação muito esquisita e muito gostosa ao mesmo tempo.
De repente, ela entrou no cio. Todos ficaram literalmente malucos, principalmente nós, os cães, hehehe.
O pior aconteceu. Fomos separados da Vick. Ela foi presa! Ficou confinada no quarto do Luiz.
Fiquei histérico. Eu não parava de pensar nela, meu estomago doía, meu corpo tremia. Tava apaixonado.
Descobri que amor também dói, fisicamente. Quero relatar antecipadamente que naquele tempo eu era bem mais jovem e esbelto, com sensações que nunca tinha experimentado antes.
Na casa em que morávamos tinha um portão baixo que separava o quintal do fundo com a frente da casa. Eu, movido a pura adrenalina não parava de pular de um lado para outro do portão. Não deu outra, machuquei o meu pipi de tanto bater no gradil.
Fui parar no veterinário. Mas não foi somente esta humilhação que tive que passar. Minha mãe tinha que fazer curativos no local três vezes ao dia e tudo supervisionado pelos meus outros irmãos caninos. Que vergonha, fiquei mancando por vários dias...
Uma noite como não conseguia parar de latir, uivar por causa dela, Marcello me levou novamente ao veterinário, às três horas da manhã. Estavam com receio que eu fosse morrer de tanta excitação! Acreditem, eu estava prá lá de doidão. Tomei calmante e nada... Daí, tomei outro, com soro e aí consegui ficar um pouco melhor. E assim foram mais de 20 dias.
Neste meio tempo, arrumei um inimigo mortal, o Flash, o Labrador chocolate, doente e super invocado. Por causa do cio e de coisas dele, achou que eu queria ser mais que ele na matilha e resolveu me eliminar a dentadas. Recebi algumas nas orelhas, focinho e até no meu bumbum. A Silvana, Marcello e o Luiz faziam marcação corpo a corpo com nós dois.
Resolveram nos separar. Tive que ficar dentro de casa e ele fora. Sentia muito a falta de todos nós unidos.
Após este episódio tão bizarro lá em casa, resolvem castrar a Vick e logo depois, eu...
Novamente me senti o máximo entrando no carro indo para sei lá onde. Quando me dei conta era tarde demais.
Após, ainda meio tonto, com dor, percebi que estava no melhor lugar da casa, na cama dos meus pais. Que delícia, que cheirinho bom. Fiquei lá de barriga para cima, pensando que poderia ficar lá pra sempre.
Infelizmente fiquei isolado de todos. Quanta solidão... Logo eu, que adoro ficar com a família toda reunida!
Somente a Silvana passava algumas horas comigo. Ficávamos deitados na cama, eu bem pertinho dela. Estes momentos compensavam a falta dos demais...
Quando eu pude andar direito, me levavam para passear na rua. Revia a Vick e os outros cães. Menos o Flash, mas esta é outra história.
Em 2001 quase não se falava de castração.
Agora eu entendo. Escutei a explicação que a Dra. Patrícia, nossa veterinária, deu para a minha mãe.  Era para ajudar a controlar algumas doenças do trato reprodutivo, evitar ou tratar tumores influenciados por hormônios e que em alguns animais a castração era para evitar ou alterar anormalidades comportamentais.
Eu sei que foi um ato decisivo para a minha qualidade de vida.  
Foi mais um passo para me transformar no que hoje sou.

domingo, 17 de outubro de 2010

Eu e minha nova família

Na minha nova casa, na época, além dos meus pais humanos e o Luiz, havia quatro cães: Petrus (um Boxer, o lider da matilha. Bastava um olhar dele para todos ficarem quietos); Shadow (um Labrador preto, o segundo no comando); Flash (outro Labrador, chocolate, muito problemático, tinha muitos problemas de saúde e era super invocado) e Vick (uma SRD, que foi minha paixão a primeira vista). 
Vick estava muito doente. Teve cinomose, que causou paralisia da cintura para baixo, mas tinha tanta força interior que me despertou uma vontade enorme em ajudá-la. Esqueci de falar também do papagaio e um montão de canarinhos e periquitos.
Nossa, era bicho que não acabava mais e a Silvana e o Luiz ainda resgatavam passarinhos doentes, mas cuidavam e soltavam novamente.
Aos poucos fui me acostumando a minha nova casa. A Silvana me ajudou muito, sempre carinhosa, me auxiliando nesta adaptação. Aonde ela ía, todos acompanhavam, mesmo a Vick que era carregada no colo.
Após tratamento com neurologista, Vick começou a fazer acupuntura. Lá fui eu junto. Fiquei muito feliz quando me levaram, mas tardiamente percebi que eu também iria passar por uma bateria de exames e vacinas. Doeu muito, mas apesar do incomodo, era para o meu bem.
A Vick fazia as sessões na clínica e em casa, Silvana fazia muitos exercícios com ela. Resolvi ajudar. Passei a mordiscar as patinhas de trás dela, sempre brincando e a incentivando a se movimentar, mesmo que fosse pouco. Coitada, era muito triste não poder andar e fazer as coisas sozinhas como nós.
Acreditem, depois de quatro meses ela começou a mexer o rabo e finalmente andou.Acho que foi um dos dias mais felizes da minha vida. Todos pararam para vê-la e a partir deste dia, nos tornamos inseparáveis.
Com este fato, minha mãe Silvana começou a perceber que eu tinha algo diferente.

sábado, 16 de outubro de 2010

Como tudo começou

Este sou eu no dia em que fui resgatado. Foi em 2001, no estacionamento do super mercado Carrefour. Já estava tão cansado, alguns funcionários estavam jogando latinhas de cervejas em mim e eu não sabia mais aonde me esconder. Parei na mureta da entrada do estacionamento para descansar. De repente, um homem sentou do meu lado. Levei o maior susto, mas ele conversou comigo, me deixou tão tranquilo que não aguentei e me encostei nele. Percebi que ele falou pelo celular com alguem para me levar para a casa dele. Quando me dei conta, já estava dentro do carro. Senti um alívio muito grande, finalmente eu teria um lar.
Quando cheguei, tive uma recepção barulhenta. Uma mulher grandona, Silvana, Luiz e mais quatro cães vieram ao meu encontro. Logo fui colocado dentro da banheira. Meu banho durou mais de uma hora e meia. Tinha muitas pulgas e carrapatos, mas todos foram embora. Nunca fui tão esfregado. Fiquei branquinho,limpinho e sequinho.
Após me deram comida. Todos comiam juntos, cada um com o seu pote. Fiquei eufórico ao ver tanta comida. Comi a minha e também a de meus novos irmãos.Ninguem fez nada comigo, eles me olhavam como que entendendo a minha situação.
Me deram uma coberta quentinha, mas por gratidão, todos os dias, por uma semana, dormi agarrado no Marcello, homem que me resgatou.
Aliás, meu nome foi escolhido por ele, que no dia em que me encontrou, havia fechado um grande contrato com um cliente do Paraná. Em homenagem, este foi o meu nome: "Paraná"!
Eu não sabia, mas mudaria para sempre a vida da minha nova família e me tornaria um Cão Terapeuta.